Uma decepção o filme! O que Antes do Amanhecer e Antes do
Por-do-Sol traziam de beleza filosófica, existencial, plástica, sonora, Antes da Meia-Noite desfaz. Não desfaz
completamente porque, graças a Deus, os dois primeiros filmes são impecáveis e
continuarão assim. Já esse, coitado, esse é um xingamento ao cinéfilo. O filme
começa com Jesse (lindo, aos quarenta e um anos), levando o filho do primeiro
casamento ao aeroporto e conversando com ele, enquanto Celine (linda também, com a mesma
idade) esperava-o no carro, juntamente com as duas filhas gêmeas. A conversa de
Jesse com seu filho foi atrapalhada com minha gastura por conta do bilhete
perdido, minha mente não lembra quase nada desse diálogo. Mas quando Jesse
volta e entra no carro para viajar com a família para a Grécia, aí sim é que
meu juízo apertou. O que vi foi uma Celine verborrágica, chata, reclamando de tudo.
E eu que já estava com o juízo apertado, foi dando um nó e sentindo vontade de
sair do cinema. Cena longa, o carro em movimento, Jesse ainda inteligente e
espirituoso, num contraste terrível com aquela mulher falastrona e reclamona.
Quando finalmente chegam à Grécia, continua a chatice do converseiro, agora com
um monte de gente numa mesa. Dai-me paciência, Deus, quase saio da sala! Três
pessoas saíram, e antes do final mais duas (a sala estava quase vazia). Nunca
vi tanta pobreza de conversa! Nem eu conversando com minhas amigas falamos
tanta bobagem. Cadê aquele diálogo profundo de Jesse e Celine dos dois
primeiros filmes? Foram para o esgoto da relação familiar. Aqui é que o filme
morre de vez. O diretor repete a fórmula do diálogo andante (o de Viena,
maravilhoso, o de Paris, idem) agora pela Grécia, os dois conversando até
chegarem a um quarto de motel. Só que o que ouvimos é de uma pobreza
constrangedora. Se o diretor quis ser fiel à realidade, mostrando que “todo”
casamento cai na rotina e se estraga, foi incoerente consigo mesmo ao propor
algo diferente nos dois primeiros filmes. Ora, todo amor que dá certo tem que
virar uma droga daquela? Até a palavra “cagar” sai com raiva da boca de uma Celine ciumenta,
amarga e enraivada por ter sido mãe apenas, enquanto Jesse ficou famoso como
escritor em suas turnês pelo mundo. Jesse salva a cena sempre: inteligente,
maduro, espirituoso. Por que o diretor fez questão de acabar com a personagem
inteligente que foi Celine nos dois primeiros filmes? Por que a mulher tem que
ficar, depois de anos casada, descrente e sem tesão? Por que os casamentos têm
que ser transformados na mesma coisa? Com os dois primeiros filmes, o diretor
tinha tudo para mostrar não a comum realidade sem imaginação e repetitiva do comum
casamento, mas a credibilidade no aprendizado do amor, que se faz com o
cotidiano, com a rotina. Era esse o desafio dele. Não conseguiu. Transformou
dois personagens apaixonados e apaixonantes em duas pessoas corriqueiras; só
não digo medíocres porque salvou Jesse. Mas pergunto: por que ele fez de Celine
um estereótipo? Celine, sensível, inteligente, linda e culta que conhecemos nos
dois primeiros filmes, se transformou num ser deplorável: ciumenta, dona de
casa, mãe de gêmeas, frustrada, e sem qualquer sensualidade. Uma tristeza. Assista
ao filme, assim mesmo. E se, por acaso, como aconteceu comigo, você “perder” o
bilhete, não compre outro, vá embora. O bilhete que não se perdeu foi um aviso.