sábado, 12 de abril de 2008

Aos doze anos

Aos doze anos comecei a entrar no "universo da poesia". Ops!, primeiro entrei no "universo das quadrinhas". Vivia a procurar rimas. Na hora de dormir, perguntava insistentemente à minha irmã qual a rima que ela conhecia para tal e tal palavra. Resultado: no outro dia, quadrinha... para "meu time O Bahia", para os colegas, para os professores, para minha rua, para minha cidade, etc, etc, etc... Lembro muito bem quando descobri a maravilha que era escrever a palavra "constância". Vivia a colocá-la nos versos, sem nenhum pudor da repetição. Era num caderno grosso, meu Deus (imitando aqui Clarice), que eu escrevia tanta bobagem. Na primeira página: "Minhas primeiras poesias". Do lado esquerdo a imagem enorme de uma baiana vendendo acarajé. Até hoje me pergunto por que tal imagem; eu que sempre estive tão longe do acarajé e tão mais perto do godó. Sei lá, vá entender a cabeça de uma menina de doze anos. Sei que o caderno durou muito, já que era tão grosso e pretensioso. E famoso (que me perdoem a rima inoportuna), pois todo mundo na cidade falava dele. Além de muitas pessoas me encomendarem poemas, queriam lê-lo. Pai ficava cheio de orgulho e alarmava para todos a maravilhosa vocação da filha. Só que eu não lhe mostrava os poemas de amor: só deixava ele ler as quadrinhas inocentes.
Foi num domingo à noite. Não tive escapatória. Depois de ele insistir uns três meses para ler o caderno inteiro, à sós, como sempre gostava de ler: antes de dormir, não encontrei mais desculpas. E assim como lia todos os cadernos do jornal, nesse domingo ele leu, até altas horas da madrugada, meu caderno de poesia inteirinho... Do quarto eu ouvia, com o coração batendo forte, o som de seus dedos passando as folhas...

5 comentários:

Anônimo disse...

Caramba! Isso é que é saber narrar...! Se o caderno ainda existe, você é dona de um tesouro. Abr. (carlos)

Muadiê Maria disse...

Esse caderno é puro ouro.
Caderno cheio de letras e dedos de seu pai.
beijo

Carlos Rafael Dias disse...

Que lindo.
Eu também tinha um caderno de poesia, que me fiz perdê-lo, por pura vergonha da minha doce inocência.
Que pena!

Anônimo disse...

meu pai tb foi o meu melhor e maior leitor, ele lia meus contos, ficava comentando comigo dos personagens, dos lugares, queria sempre saber os finais das histórias q nem eu sabia..saudade pai!

Kátia Borges disse...

Querida, que história linda, como todas as que leio nesse blog, um dos melhores. Beijo enorme!