sábado, 8 de novembro de 2008
Jogando cartas
Vou com mais regularidade à taróloga que ao médico. Digo "a taróloga" porque tenho uma que joga pra mim há mais de quatro anos. Com ela não é esse negócio de jogar tarô como quem abre um baralho comum pra jogar burro. Não, ela é uma profunda conhecedora das cartas e, óbvio, do ser humano. O que acontece numa jogada, que dura aproximadamente duas a três horas (dependendo de suas necessidades), é um bate-papo diante de um tarô que envolve mesmo, de fato, o autoconhecimento. Não é mera adivinhação. É algo mais próximo à intuição, conhecimento dos símbolos do mundo, percepção de todos os abismos e de todos os segredos que andam pelo ar. Funciona muito mais como terapia, e eu sempre volto pra casa com mais clarividência do meu mundinho interior problemático. Não é aquela coisa de sair como saiu Macabéa da casa da cartomante achando que vai encontrar o príncipe encantado e, conseqüentemente, morrer atropelada. Não, saio de lá sentindo as grandes verdades das cartas (e que são as minhas mais cruéis e vitais verdades), que não mentem para me comprar com uma felicidadezinha rasteira e momentânea. Muito pelo contrário: saio querendo estar consciente de tentar ser eu, euzinha, essa coisa que veio ao mundo não sei pra quê e que come depressa, empurrando tudo barriga adentro, sem sentir o gosto da comida. Não é à toa que a maioria dos viventes morre sem ter consciência da sensação de como é mesmo o vento bater na pele.
Todo esse preâmbulo é pra dizer que HOJE eu fui à taróloga. Ela mora longe. Fico mais de quarenta e cinco minutos dentro do ônibus. Depois atravesso a rua debaixo do sol quente, vou tentando encontrar uma sombra aqui e acolá, andando uns sete minutos até chegar à sua casa. O que mais me emociona no tarô é a confabulação das cartas retiradas: todas elas conversam entre si e dizem de nossa alma. São muitos símbolos e verdades; nunca absolutas, obviamente.
Essas cartas todas são muito minhas conhecidas. Com relação ao amor, "Os Enamorados" me definem: há sempre um triângulo amoroso na minha vida. A minha carta de nascença é "A justiça": sou dura comigo tal qual um magistrado arrogante e um feitor cruel. Como meu aniversário está próximo, estou saindo (graças!) do "Enforcado" (ou "O Dependurado") que foi a digníssima carta que me acompanhou todo esse ano; acompanhou o meu sofrimento, digo, enforcamento, ou "dependuramento". Mas está chegando uma outra cartinha mais amena, "A Morte": hora de jogar na fogueira tudo que já morreu, podendo finalmente renascer em paz, porque a Temperança me espera no ano que vem.
Desde criança me interesso por esses assuntos. Lá na minha terra quando uma pessoa quer ir ao pai-de-santo diz que vai "abrir revista". Já abri muita revista por lá; mas depois que descobri o tarô me tornei alguém mais consciente de minha própria existência. Descobrir-se gente, com nome, carteira de identidade, endereço no mundo e coisa e tal é coisa de assombrar. Experimentem se descobrir apenas nesses dados tão simples e perceberão como o negócio é de estarrecer.
*Imagem: www.flickr.com
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4 comentários:
Taí, Aero... você é surpreendente! Já fui em cartomante simplesinha mas nunca à taróloga.
Já fui a todas e todos. uma que me foi indicada por judith em 1983, até hoje não me deixa dormir sossegado!
Muito bom esse texto sobre sua relação com o tarô. Você realmente escreve com uma simplicidade e um domínio tão grandes e a gente sente uma intimidade tal que é como se vc não se escondesse por trás da aérea persona. Quanto ao tarô sou meio desconfiado ... prefiro o I Ching.
Você sabe que não confio muito nesse negócio. Também, perdi aquela sede que tinha de saber o que vai acontecer em minha vida. Como elas não dizem só coisas boas, estou dispensando más notícias. Mas, se você acredita e lhe serve de guia para enfrentar seus desafios, continue.
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