quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Tributo ao rio


Uma das cenas mais líricas de minha infância sobreviverá, tenho certeza: eu descendo as escadarias do quintal de lá de casa, pela manhã, bem cedo. Ia escovar os dentes no rio. Um riozinho manso, raso, que dava para ver a areia: fininha... Lembro da pedra que acolhia meus pés quando eu chegava... Me debruçava sobre as águas, e o rio limpava meus dentes e minha boca do mingau das almas deixado na noite anterior. Aquele era um rio despretensioso. E eu dele conhecia tudo: sabia exatamente onde os pés atolavam; via cada mato que molhava suas folhas ali perto; das pedras me interessava o mais tolo e morno dos segredos: aquele de ali ficar, anos, tocando as águas, com seus frágeis dedos.

7 comentários:

Muadiê Maria disse...

Que beleza imensa, vc foi uma criança de muita sorte com um rio a seus pés...


Fiquei muito feliz com seu comentário, pois como admiro a sua sensibilidade, é uma opinião importante pra mim.

Um beijo,
Martha

Anônimo disse...

Um rio assim, é um sonho recorrente. Sonho que desço degraus no final da varanda do Cabula e encontro uma água maravilhosa e mergulho!
Claro, nem degrau nem água havia por lá. Sou eu sempre querendo o útero de minha mãe.

Bernardo Guimarães disse...

Minha infancia na fazenda me colocou dentro de um rio, tambem. Aprendi a nadar, fazia jangadas de bananeiras e pegava camarãozinhos-de-agua-doce no cesto, pra fritar e comer.
Pena que meus filhos não tiveram a mesma chance...

Nilson disse...

O rio de Brumado sempre foi barrento. Mas meu pai prometeu desde sempre, e nunca cumpriu, um passeio prum idílio chamado Cristalândia. Era um distrito, pertinho, mas foi protelado ad infinitum. Cresci e não fui lá mesmo. Ia quebrar o encanto daquele nome brilhante: Cristalândia.

Anônimo disse...

Um das coisas mais bonitas que li nos últimos anos.

Muadiê Maria disse...

Me inspirei em seu rio e fiz o meu tributo. Tá lá no muadiê.
beijo

Menina da Ilha disse...

Muitas vezes me bastava só ficar da janela da cozinha olhando o nosso rio. Fiquei muito feliz quando fui lá em julho e ele estava vivíssimo. Parecia que o tempo não tinha passado. Faltou você.