quarta-feira, 29 de maio de 2013

mulher


"(...) Quem não teve a sorte de encontrar em sua vida uma mulher genialmente feminina não sabe o que é uma mulher". (José Ortega Y Gasset)


terça-feira, 21 de maio de 2013

A vinda


Falaram que era minha hora de vir: não queria, dei chilique, corri para dentro das nuvens. Um Senhor com vestes brancas gritou alto para os outros: "É a menina, peguem ela aí!" Esses outros conversavam numas árvores perto das nuvens, todos também de branco. Diante do comando, desataram a correr olimpicamente atrás de mim. Me escondi dentro da nuvem mais densa, mais escura, que trazia como promessa uma trovoada de acabar mundo. Mas esses Senhores de branco eram donos das nuvens, donos de tudo, e sabiam que eu teria que vir. Me pegaram a pulso, eu esperneando gritava "não quero ir, não quero ir!", chorando aos berros, apelando para Jesus, "Jesus por favor me salve!" Ele, no mesmo instante, de longe, me enviou um aceno: o aceno mais belo, mais forte, e que me impulsionou a vir, sem mais gritos, só choro, um choro miúdo, resignado. Aqui estou. Não é fácil isso não; aqui peso tanto que não levito, e há uma dor cravada no peito que não facilita as coisas. Mas não dá para esquecer o aceno de Jesus quando resolvi ceder e vir. Não dá. Lembro agora desse aceno terno e afetuoso, e luto para conseguir forças para continuar seguindo. Sinto enjoos, tonturas, não me adapto à essa temperatura compacta, ao peso do corpo, mas preciso ficar até o fim, quando talvez, nesse fim, possa descobrir a finalidade de minha vinda.

domingo, 12 de maio de 2013

Volver a los 17



Ela, linda, aos 17 anos. Vestiu o vestido que mais gostava, calçou a singeleza das sandálias campesinas, com as pernas cruzadas. No braço um relógio delicado, e no pescoço uma volta (corrente) sutil, quase não vista. Ocorria um momento importante: o retratista passava pelo povoado. E era preciso guardar-se para a posteridade: por isso a pose, e, a melhor das coisas, o sorriso. Um sorriso lindo, que sequer adivinhava o que viveria adiante. Nessa época eu nem imaginava vir ao mundo, eu que de onde estava não queria vir pra cá de jeito nenhum e me trouxeram a pulso. Mas vir dela me deu mais calma, por isso sempre nos entendemos, temos as mesmas manias, o mesmo nonsense. Dela herdei a tragédia do medo do mundo: nasci algum tempo depois que ela viveu uma de suas maiores tragédias: perder uma filha de sete meses em questão de segundos, sem qualquer resposta à sua pergunta: "Cadê Noélia Lúcia?" Até hoje eu faço uma pergunta semelhante, só que é "Cadê eu?" 
Hoje estamos distantes uma da outra por quase trezentos quilômetros; ligarei para ela, mas não poderei lhe dar o abraço que aprendi a dar: abraço frouxo, mas amorosamente intenso. O que farei durante todo o dia hoje, já que não poderemos sorrir juntas, é mirar esse seu sorriso lindo, e voltar aos 17 com ela.