Cruz e Souza terminou a vida sendo funcionário da Estrada de Ferro Central do Brasil, na condição de arquivista. É sabido que o mesmo foi denunciado à diretoria de tal Empresa em virtude de ter sido encontrado "um poema de sua lavra" em local de trabalho. Lê-se no final do texto denunciador: "Pede-se providências".
Ah, o serviço público e a literatura... Drummond e o Amanuense Belmiro, dois conhecedores do universo burocrático: o primeiro, poeta e funcionário público (declarou muitas vezes que escrevia no expediente); o segundo, personagem aspirante a escritor e funcionário público num romance magistral, hoje esquecido, de Cyro dos Anjos ["O Amanuense Belmiro" (1937)]. Ambos - o poeta e Belmiro - conheciam bem esse mundinho cinzento da burocracia, tanto que o amanuense registra, o tempo todo no seu diário, poemas de Drummond, como a revelar um feliz diálogo entre profundos conhecedores do que há de mais inóspito no destino de um homem.
... E pensar que eu, aos vinte e dois anos, entrei para o serviço público... Enquanto o que mais queria mesmo era ler e escrever versos. Mas eu tinha minhas artimanhas. Levava o livro escondido na bolsa, colocava-o dentro da gaveta de minha mesa e quando o escrivão (trabalhava num cartório) vacilava, eu abria a gaveta e o livro - dando, assim, as minhas roubadinhas. A mesma coisa com a máquina ("facit") de escrever. Às vezes fingia que estava batendo um mandado... que nada!, estava era escrevinhando poesia, versos ingênuos, literatice... Era a maneira que eu tinha de agüentar o linguajar desumano dos processos.
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2 comentários:
Apesar de ainda não ser func. pública, eu tb faço isso. Sempre tenho alguma versão de bolso pras horinhas de folga. Mas escrever eu não consigo, não. Só à noite, qdo todo mundo já foi se deitar.
Ah, Aeronauta...
Compreendo muito bem a sua angústia. Porque ela também é a minha. Por que não ganho dinheiro como escritora? Por que preciso me fantasiar de advogada para o mundo olhar para mim com respeito? Até quando viverei com livros escondidos na bolsa?
Bjos.
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