segunda-feira, 12 de abril de 2010
canção para ela
Tecer teus dedos, menina. Tuas unhas sujas, cavando o chão do quintal. Aprendendo as vogais, escrevendo teu nome no Certificado do Dia das Mães. O vê de vilma era tortuoso, o a de ângela, quadrado. Era uma letra torta, enviesada, tal qual teus dentes de leite falhados. Tecer teu corpo, gordo, rechonchudo. Teu cabelo nos mundos, quebrando pente, amolecendo, à revelia, a mão de quem o penteava: mão de mãe; calosa, cheirando a cebola, alho, brilhantina. Trançar de novo teu cabelo, menina, rapunzel sem príncipe, pois que o inverno logo vem, e cabelo despenteado é algo melancólico. Tecer, tecer. As roupas também, de organdi azul, para que possas ser baliza, à frente da banda de música. Tecer tua dança, finalmente orquestrada, como se fosse para sempre vida. Como se não fossem embora nunca, nunca, tecer teus pés na calçada, no alvo certo da amarelinha, na queda lírica do patim. Imobilizar, sim, as nuvens, menina, para que não possas sair...
Imagem: eu, aos sete anos. Fotografia de Mozart Santana.
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12 comentários:
belo texto, menina, tecer com palavras, sempre.
Com os olhos afogados em água, reconheço o tecido colorido de afeto tão desejado por qualquer menina.
O que mais posso dizer? Cada texto sempre arrebatando essa sua leitora.
Que coisinha mais fofa a menininha, me deu vontade de abraçar, beijar essa linda. E uma saudade de quando a minha filha era desse tamanho!
que barato a japinha! tomara que chorik veja que tem japa na bahia!
Linda menina, lindo texto. Quando leio o que você escreve, Aero, fico como a Gerana: arrebatada.
Ah, adorei ler teu comentário em meu blog. Ainda mais vindo de alguém que admiro tanto. Obrigada. Um beijo.
Que linda menina em trajes nipônicos!
Aero, sempre que te leio fico estático e extático por segundos; chego a subir às tuas nuvens, fascinado.
Parabéns mais uma vez.
Muito linda a menina, pelo retrato das palavras, um ser sensível e natural. Recortei a palavra "brilhantina", e lembrei o nome de duas marcas: Gessy e Glostora, e fechei os olhos e aspirei o cheiro forte delas, no cabelo das meninas...
Faz tempo isso, mas o cheiro continua aqui, guardadinho, a exalar.
Beijo, Aerovilma.
Reparou que essa é a única foto que você não está com cara de medo? Até eu senti saudade dessa japonesa. Lembro-me como se fosse hoje do dia em você tirou essa foto. Fiz minha viagem no tempo.
Amei este seu texto que ao mesmo tempo apertou meu coração e me levou às nuvens, tão comovente, tão bem escrito.
Concordo com o anônimo que me antecedeu (menina da ilha?): como a sua expressão está ótima, relaxada nessa fantasia, a menina parece estar curtindo muito. E a achei parecida com a mulher de hoje.
a mesma carinha de hoje... olhinhos como pirilampos, já sonhando versos.
beijos.
Olhinhos tecidos nas águas de memória. A menina dos cabelos pretos orientalizando uma pose. Lindo! Ricardo Nonato
De tudo nessa foto nao poderia deixar de observar tuas maos. A mesma segurança q segura o leque, é a mesma que vejo a segurar degraus de livros que tu retiras do teu labirinto[estante]. As tuas mãos hoje nao sao mais de meninas, sao de mulher. Mãos q guiam os sedentos e desejosos a se perder na sensibilidade do teu labirinto.
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