sábado, 1 de outubro de 2011
à distância
Pai teve várias fuscas, de muitas cores, e em todos eles um toca-fita pendurado. Nele se ouvia, como me lembro e dói, Olhe, olhe o trem, vem surgindo detrás das montanhas azuis, olhe o trem..., de Raul Seixas. Sinto ainda hoje o cheiro das fitas cassetes, assim como da poeira que revestia os bancos de trás do fusquinha, onde eu me instalava. Pai pendurava-se ao volante, tão nervoso, via-se que não havia nascido para dirigir. Nasceu mesmo foi para amar. Ele também teve um fiat branco. O último carro seu foi um passat, que vendeu a fim de pagar os tratamentos que lhe deram a mais dolorosa sobrevida. Hoje estou com muitas saudades dele. E de uma pátria que fica a cada dia mais longe, mais longe, quase não mais a alcanço. Nela, sei, ainda há pontes, e aquelas enchentes bravias que as dominavam, tal como se domina uma criança. Mas não chegam até aqui, onde estou. Onde estou chove muito, mas as águas desaparecem.
Imagem: www.google.com.br
Assinar:
Postar comentários (Atom)
7 comentários:
Aeronauta, Seus textos sempre com a sua impressão,sua memória e sua simplicidade em rabiscar. Sempre a presença do eu, uma forma de escrita que admiro muito.[ah, obrigada pela passagem em meu blog e pelo comentário,sinceramnte não escrevo assim não,escrevo lá para extirpar aquilo que sinto.]
obrigada,
:D
Ângela, saudade de você. Bjs
Naiana, é sempre muito bom tê-la por aqui.
Lidi, também tenho saudade de você.
Bjos.
Seu escrito me fez lembrar Ângela, a Gal Costa cantando uma belíssima música que nos encanta dizendo assim: "e o pai seja pelo menos o universo". Grande abraço.
Que lindo, Aero:
"Onde estou chove muito, mas as águas desaparecem".
Há muito, tudo desaparece tão repentinamente que nem parece ter existido.
E a nossa pátria? Ah, a nossa pátria!
Que saudade! Também parece nunca ter existido a nossa pátria...
E parece nunca ter tido pontes...
E como eram servis aquelas nossas pontes...! Na verdade, eram aquelas pontes fontes onde nos abastecíamos de juventude e quimeras em cada deliciosa travessia e travessura.
Abraços,
Anônimo I
Saudades, Anônimo I, de nossa pátria, de nós, do que fomos.
Grande abraço.
"E como eram servis aquelas nossas pontes...!": lindo isso, Anônimo I!
Postar um comentário