sábado, 19 de novembro de 2011
quando uma mãe conhecida morre
Para Mayrant Gallo
As mães nunca deveriam morrer. Drummond disse algo assim, mas de uma maneira linda. Eu digo aqui, à minha maneira, como uma dor prenunciada, ensaiada, dolorida. Não, Deus, não permita que minha mãe vá embora, e de novo parafraseio tristemente Drummond. Toda vez que uma mãe conhecida morre, morro num soterramento plano.
Em maio de 2010 senti um grande abalo. Em maio de 2010 morreu a mãe de minha amiga de infância, uma segunda mãe, e que se dava tão bem com a minha, de muitas e longas datas; ambas viram as duas meninas, eu e minha amiga, cresceram. Ambas conversavam sobre rádio e novela. Quando essa mãe querida, e tão parecida com a minha, morreu, eu sofri muito; era como se, Deus livre e guarde, morresse um pedaço de minha mãe, como se fosse um pré-ensaio de sua morte. Chorei de maneira multiplicada.
Ontem morreu a mãe de um amigo. Uma mãe conhecida, que exercia, igualzinho à minha, o papel de mãe. Ambas foram apresentadas num Natal de dois mil e cinco, e estavam vestidas com um vestido parecido; logo se identificaram. Deram-se tão bem, e no mesmo instante já estavam trocando a receita de rabanada. Ontem soube de sua morte, e de repente senti a pontada da dor, o anúncio de uma dor ingrata, pérfida. Passei vários emails para o meu amigo, imaginava que a dor que ele sentia era imensa, pois que repercutia em mim de uma maneira terrivelmente incômoda e cruel.
Disse Jorge Luis Borges, sabiamente, que devemos olhar para todas as pessoas como se elas já estivessem mortas. Faço esse exercício desde que li tal frase. E olho para mãe sempre com lágrimas nos olhos. E nem posso pedir a Deus para eu ir antes dela; não posso, pois de todas as saudades e dores que uma mãe pode sentir, essa deve ser a mais inimaginável e perversa.
Imagem: Cena do filme "Roma, um nome de mulher" (2004), de Adolfo Aristarain.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
10 comentários:
Oh, amiga, eu estive lá, na despedida, e vi uma dor imensa nos olhos do nosso amigo. Eu o abracei por você. Bjs, M.
Lindo o teu texto. Perdi a minha mãe em 97, e toda vez que eu alguém perde sua mãe isso me comove, pois esse é o único amor incondicional que conhecemos. O único consolo é que a outra hipótese seria ainda pior para elas. Bjs, e que a tua mãe te acompanhe ainda por muitos anos.
As mães, realmente, não deveriam morrer. Fui ao funeral de Dona Maria, dar um abraço no nosso amigo, em Andréia, e fiquei pensando nessas coisas. Não consigo imaginar a minha mãe morta. Dor imensa. Bjs
P.S: Sei que você não pode ir a Salvador, hoje, mas senti a tua falta. Saudades, Aero.
Oi, M. e Lidi, sofri muito por não ter ido abraçar, pessoalmente, o nosso amigo. Infelizmente não foi possível.
Terráqueo: essa, imagino, deve ser a pior dor que existe.
"Chorei de forma multiplicada" ao ler seu texto! Perdi minha prima essa semana e senti, ainda venho sentindo uma dor enorme que não consigo comunicar a ninguém.
Foi nessa semana,que os filhos da minha prima perderam sua mãe.
Um beijo,
Mila.
Obrigado, A.! Você me arrancou lágrimas. Acabei por reproduzir seu texto no Não leia! Vá desculpando esta audácia. Abraço forte!
Mila, essa dor, por mais cruel, nos faz acordar e olhar.
Mayrant: não há qualquer audácia, mas diálogo de sentimentos em meio a essas perplexidades dolorosas. Fico comovida demais em ter chegado, com meu texto, perto de você.
Retornei à "Vestido Azul". Exercício que faço toda vez que a lembrança de minha mãe me consome.
Fico grato em dividi-la com essa multidão de filhos que conquistou como segunda mãe.
Muitíssimo obrigado.
Widal.
Oi, Widal, bom tê-lo aqui; saiba que a lembrança de sua mãe, dona Clotildes, está sempre perto de mim; pessoa querida demais, segunda mãe que ela foi minha, e que deixou uma saudade que jamais deixará de doer. Abraços.
Impossível ler e não sentir um nó apertando a garganta. Com todas as diferenças e limitações que temos com nossa Terezinha, não consigo nem pensar em perdê-la. Peço todos os dias que ela viva, no mínimo, o mesmo tanto que nossa avó. Saudade. Mã
Postar um comentário