Tinha oito anos e corri atrás do trio elétrico. De mortalha, com as mãos cheias de confetes e serpentinas. O trio elétrico era um caminhão velho, bastante antigo, que a prefeitura guardava para essas ocasiões. Nossas amigas todas de mortalhas coloridas, e eu tímida atrás sem saber como pular. "Levanta os braços!" , diziam algumas. Mas o sonzinho que vinha do trio elétrico, ou melhor, do caminhão, não era muito animador. Três músicos que a sociedade dos garimpeiros, todos os anos, doava para fazerem o carnaval: um tocava bandolim, outro violão, outro batia num prato. Não tinha vocalista. Só um sonzinho miúdo, eles sentados num banquinho em cima do dito caminhão dando mil e uma voltas na rua, até o anoitecer.
Na verdade era no clube que eu preferia soltar confetes e serpentinas e garantir minhas puladas. Mãe e pai levavam eu e minha irmã, vestidas, claro, de mortalhas. Eu gostava de notar as serpentinas unindo as pessoas num nó, e de perceber os confetes grudando nos cabelos das pessoas. Havia algo mágico, feérico, nisso. As músicas saíam da voz de uma radiola mais ou menos potente, com imensas caixas de som em cada lado do clube. Os frevos e o "atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu" nos deixavam suadas de felicidade com tanto pula pula.
Não, hoje eu não saberia acompanhar o trio elétrico, nem que fosse o velho caminhão da prefeitura. Muito menos pular no clube. Pois não sei se ainda há a iluminação mágica dos confetes e a união, o nó, que, à nossa revelia, proporcionavam as serpentinas.
Imagem: www.flickr.com
Assinar:
Postar comentários (Atom)
9 comentários:
muito lindo, Aero. De dentro!
Beijo Maria
Aero, minha mãe sempre costurou muito bem, e eu tive a sorte de ter fantasias lindas como odalisca, cigana...lembro de meu irmão vestido de pirata.
Hoje também não tenho disposição pra tanta corda, gente e confusão.
um abraço,
Pois acredite que os multicoloridos confetes continuam a iluminar-se mágicamente, dando nós nas desistências da vida.
Da união das pessoas é que o afecto se encontra moribundo...
a razão pura, se calhar tem culpa
Xaxuaxo
Leio-te sempre e admiro tua versatilidade. A qualidade dos teus textos às vezes inibe minha vontade de comentar. Penso que você nasceu para ser protagonista da vida e por isso encontra sempre em tuas memórias o lirismo no cotidiano. Obrigado por mexer com meu imaginário e me fazer sentir co-adjuvante de tua história.
Bj
Eu também me amarrava (ops!) numa serpentina... Beijo!
Não, não há mais isso dos confetes e serpentinas.
No lugar de serpentinas, hj lançam latinhas de cerveja, por exemplo.
Oo
Em Brumado tb teve caminhão travestido de trio elétrico. Mas a cidade era maior e logo vieram os trios de verdade, um carnaval que atraía foliões de toda a região e os inevitáveis blocos: Poleirão, Germes da Era. Era meio outsider pra entrar nesses blocos, mas uma vez criamos o nosso próprio,com meia dúzia de integrantes: o Depravado, primeiro e único bloco carnavalesco anarquista da cidade -talvez do mundo!!! Engraçado era o contraste: um bando de garotos que nem namorada tinham e aquele nome, com o A dentro de um círculo: ácrata!!!
Pronto, e sumiste do carnaval. Cadê você?
Deus nao da asa a cobra, vc aih no meio da folia e eu aqui viuvo do carnaval!! :)
Postar um comentário