quarta-feira, 25 de novembro de 2009

por que ler os clássicos


Não sei quem foi o primeiro dono desse exemplar. Comprei-o no sebo. Estava num balaio, que trazia em cima a seguinte inscrição: "3 por 1 real". O seu primeiro dono possivelmente é morto há muito tempo, pois que essa edição é de 1949. Não sei quem passou por essas páginas, por onde passei hoje numa velocidade estarrecedora. Não jantei. Não tomei banho. Minhas mãos ficaram congeladas no livro. Esse é um dos seus feitiços, dentre tantos, maiores que a história que carrega. E veio forrado de um plástico cor de rosa, talvez por seu primeiro e único dono. A cada toque o plástico ia desfalecendo nos meus dedos. Porém, o afeto foi muito, e o forro da capa resistiu mais de que sua totalidade. O cheiro de passado nele é forte, e na página 62 tem o número 10 escrito a lápis de um jeito desajeitado, parecendo feito por dedos incipientes de uma criança. Talvez fosse o filho do dono ou da dona do livro. São muitas histórias a especular. Todas provenientes de uma maior, contada por um estilo que enfeitiça, juntamente com as páginas antigas, amarelas e seu cheiro forte de passado...

"(...) E como se o céu comprazesse e comungasse com esta grande felicidade dos dois, um raio de sol atravessou a floresta, esverdeando cada folha e acendendo cintilações nos cinzentos troncos das vetustas árvores. A claridade dominava tudo e o riacho iluminado revelava, por fim, seu misterioso percurso no seio da floresta." (p. 133)

12 comentários:

Flamarion Silva disse...

Esta semana vi este livro na biblioteca da UFBA, não exatamente da edição de 1949, nem em língua portuguesa, outra edição, em inglês. O fato de eu ter visto o filme me fez desistir da leitura. Seu texto e o trecho destacado me animam a ler o livro.
Enquanto lia o que você escreveu, o seu encantamento por descobrir a memória guardada no livro, outra imagem me apareceu: a de Amélie Poulain ao encontrar a caixinha antiga cheia de objetos infantis, e a sua curiosidade para descobrir a quem pertenceu e a essa pessoa devolver o tesouro. Lembra que o homem chora ao abrir a caixa? Sua memória foi reativada.
E este livro, o que será que ele guarda em seus vincos?
Abraço.

Anônimo disse...

Sua paixão pelos livros é comovente. Eu sou alérgico e costumo espirrar muito quando pego um livro de tão avançada idade, por isso evito, inda mais depois de ler e assistir O Nome da Rosa, do Umberto Eco.
Por falar nisso, assistiu o filme baseado na Letra Escarlate? Pra variar não chega aos rodapés do livro, mas vale uma conferida por curiosidade.
Bj

Marcus Gusmão disse...

Desconhecia o autor, o livro, o filme, mas viajei na sua emoção diante da memória, diante do texto e diante do outro livro que se escreve com o tempo.

Gerana Damulakis disse...

Diga se isso não é uma relação de amor? Diga se isso não é um momento pleno de emoção? Pois, me emocionei com o relato sobre sua leitura, sobre os sinais de uma leitura anterior, sobre a história que o livro guarda além da própria.

Alice disse...

Boa tarde, sou jornalista e gostaria de saber seu email de contato para lhe enviar uma sugestão de conteúdo para o blog. Aguardo um retorno para alice@apoema.com.br. É sobre uma palestra direcionada aos aeronautas que ocorrerá amanhã no Rio de Janeiro.
Aguardo.

Unknown disse...

Estou ficando uma velha que desistiu de sebo. Como Marcus, "Desconhecia o autor, o livro, o filme, mas viajei na sua emoção diante da memória, diante do texto e diante do outro livro que se escreve com o tempo."

Bernardo Guimarães disse...

ganhei de judith, uma caixa de livros ensebados, a maioria com escritos dos donos ou dos que presenteiam e dedicam os livros. agora mesmo estou com "16 de orígenes lessa", de quem nunca li nada antes, edições de ouro, 1976.
espirrei um pouquinho.

Janaina Amado disse...

Com saudade, passei aqui para deixar um beijo, enviado do outro lado do mundo. Como sempre, valeu a pena vir aqui.

aeronauta disse...

Flamarion: boa lembrança essa de Amelie. Fiquei pensando também se o dono desse livro (ou um filho) pudesse quem sabe reconhecer o livro com esse post.
Chorik: não vi o filme ainda não. Fui na locadora mas não encontrei.
Marcus e Maria: vale a pena conferir o livro.
Gerana: é mesmo uma grande relação de amor e paixão essa que estabelecemos com a leitura.
Bernardo: amo Orígenes Lessa. Tenho quase toda seus livros.
Janaína: saudades de você. Aproveite bastante a viagem.
Bjos a todos.

Moniz Fiappo disse...

Ví o filme. Normalmente gosto de ler o livro antes e aí, quando vejo o filme sempre me decepciono. Por que será?

Nilson disse...

Bela viagem. Eu certamente espirraria, mas viajei junto nessa hiper-leitura. Vi o filme: um xarope, o livro deve ser melhormesmo!

Domingos da paixão disse...

Eu fui cumplice dessa compra. Nunca vou esquecer nosso passeio pelos sebos. É sem duvida uma viagem inesquecivel e tentadora; tantos livros ao alcance das mãos mas asvezes distantes de nossos bolsos.