sexta-feira, 20 de abril de 2012

tudo que guardo

É preciso declarar
o infatigável imposto de renda
mas busco um livro de poesia
quero ler poesia
nesse dia tão frio

Esqueçam que tenho números
que me identificam sem apuros.
Esqueçam de mim, que não sou útil
para o mundo, de forma alguma.

Na minha casa tem facas
que nunca usei, e colheres, e pratos.
Janelas abertas como precipícios
anunciam atos dos mais graves, vazios
de qualquer realização.

Prefiro muito mais aquele filme
em que desapareço; personagem
vivo por dois segundos, num edifício
que em breve se desmorona.

Eu colecionava pedras, de todos os tipos.
Nelas gravava datas e símbolos
de minhas passagens absurdas.

Eu guardava pedras, como tantos
como tantos guardam selos
em álbuns refinados.

Continuo sem nada saber
sobre o âmago de qualquer número.
A poesia muda, inescrutável
é tudo que guardo, e não tenho

5 comentários:

M. disse...

tão belo. por isso tanto te admiro, e cada dia mais. você verdadeiramente poeta. bjs

Anônimo disse...

Calma, amiga!
Às "janelas abertas como precipícios", opte pelo imposto de renda.
Afinal, há uma luz no fim do seu túnel: você ainda tem renda. Rs...


Abraços,
Anônimo I

aeronauta disse...

M.: grata mais uma vez à sua bondade e delicadeza.
Anônimo I: você sempre espirituoso! Mas que preço, hein?, temos que pagar (ao "declarar..") por termos alguma renda. (rs) Abraços.

Blog do Akira disse...

Aeronauta, que poema belo, belo, impossivelmente belo. Um grande abraço.

aeronauta disse...

Oi, Akira, grata, querido amigo, por comentário tão delicado.