Como esquecer Zé Lope? Impossível. Este morreu e continua no mundo dos vivos. Dos vivos que foram retratados por ele. O homem era retratista, gente; um retratista genial. Tinha mania de psicólogo na hora de tirar nosso retrato três por quatro para a matrícula do colégio: o cabelo precisava estar solto. Além do cabelo solto, era necessário uma seriedade enorme nossa, solenemente sentadas na cadeira tosca com um pano branco atrás. O pior é que íamos sempre em bando tirar fotos, e uma atiçava a outra para rir. O homem ficava nervoso e começava a cantar; digo, a falar: falava cantando, pois que tinha pedaço da língua cortada por Mané Besta, o doido mais lerdo e valente que já conheci. Foi discutir com Mané Besta e deu no que deu: Mané Besta saiu no lucro e nós saímos perdendo, pois que ouvir Zé Lope falar era algo irritante. Ele era irritante, e sua fala cantada ainda mais nos irritava. Nunca vi pessoa mais compenetrada e rigorosa como aquela na arte de fotografar. E o resultado era sempre medíocre e mentiroso.
Ele tirou uma foto minha e não era eu. Foi entregar e eu não queria aceitar, pois que aquela menina horrorosa, com cabelo horrível, não era eu. Ele ficou nervoso e acabou falando aquela barbaridade cantada nunca esquecida por mim: mais ou menos que ele não tinha culpa de eu ter o cabelo que a barata roeu.
O homem era desaforado.
Não há como esquecer os desaforados.
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3 comentários:
Que personagem, esse Zé Lope... Dia desse, você podia contar de que modo Mané Besta cortou a língua de Zé Lope. Salve, salve esses textos, Aérea Persona! Abr (carlos barbosa)
Carlos, morri de rir com seu comentário. Lembro que escutei o próprio Zé Lope contando a pai, na sala lá de casa, como ocorreu o acontecido. Dia desses eu conto. Abraços.
Conte mesmo, Mulher Alada, essa história de decepamento de pedaço de língua. Bjs, M.
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