terça-feira, 15 de junho de 2010
a fé em Antonio
Passou o dia de Antonio e eu nem uma oração fiz. Vocês já sabem, mas volto a dizer: tenho tantos Antonios no meu altar! Sem falar no grande pai, de trinta e tantos anos, tem um miudinho, comprado por plena compaixão minha numa loja de santos. Tem um outro Antonio, meio elitizado, dado de presente, num kit completo (vela, incenso), por um amigo bastante preocupado com a minha falta de perspectiva amorosa. Ah, e tem outro, tão especial, tão lindo: pequeno, prateado, vindo de Pádua, e presenteado por Maria Sampaio na sua última viagem à Europa. Se eu tivesse uma máquina fotográfica, ou um celular, tiraria a foto dele e postaria aqui. Veio embrulhado num papel de presente azul, azul a cor que mais gosto. Maria de todos nós também se preocupava com minha situação não casamenteira. Posso dizer, sem medo do ciúme dos outros antonios, que esse é o mais querido. Tão pequeno, delicado, vindo de tão longe, presente de minha inesquecível amiga. Na verdade quem está nele é a presença dela, radiosa, brilhante, inundando meu altar de luz.
Como gosto desse nome: Antonio. Antoine em francês. Adoro assistir a filmes franceses quando tem um certo Antonio, só pra ouvir aquela pronúncia deliciosa, sensual, dita por alguém: Antuá. Parece que o mundo nasceu com esse nome, gritado por Deus dentro do grande vazio que antes do início se firmava. Deus gritou esse nome e a natureza se ergueu: plena, movimentando-se em pétalas sobrecarregadas de orvalhos, riachos fartos de sonoridade.
Passou o dia de Antonio, e eu me lembro de pai carregando um grande andor nos ombros. Adiante minha irmã com cachos gigantes nos cabelos e uma bandeira de Antonio nos mãos. Mais atrás uma procissão grandiosa, para comemorar esse santo meigo, que se preocupa com a solidão das mulheres. Nos meus dez anos, minha avó me deu aquele que seria o seu grande presente, fora a boneca Creuza: um Santo Antonio legítimo, benzido pelo padre Eugênio, padre-santo. Aos doze anos fiz novena e trezena pra ele, pedindo um grande amor. Sei que ele guarda dentro de seu corpo todos esses pedidos, vindos de um mundo distante, quando eu já sonhava com essa coisa esquisita que produz um frio estranho na barriga. Sei que ele, calado, lembra-se de todos os meus amores, que se esvaneceram no primeiro crepitar da vela que lhe acendi, nesses anos todos.
Oh, meu Santo, anteontem não te fiz uma oração. E minha fé em ti é tão indecisa, tão fragilmente imperfeita, que se ergue plena como teu nome.
Imagem: "Viva Santo Antônio", por Ponto Cris.
(www.flickr.com)
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6 comentários:
Uma conversa assim com Santo Antonio (sim, vc está se reportando a ele), vale tanto quanto uma oração.
Outro excelente texto. Cada frase belíssima, cada trecho de mestre.
Este ano foi o mais intenso em minhas orações e agradecimentos. Nem sou chegado a isso, mas Antônio me pegou.
Olha eu aqui, Aero. Mandei um e-mail para você. Um beijo.
P.S: Santo Antônio, santo casamenteiro... preciso fazer uma oração para ele. Bem lembrado. :)
Tudo tão bom nesses seus textos! Incrível como faço vários recortes, como se fossem pedaços da minha vida, que retornam. Me impressiona o léxico, basta ler/ouvir uma palavrinha sua/minha retirada lá do fundo da memória, e as imagens vêm: "miudinho", "andor",
"anteontem". Eu ouço a voz de pai, de mãe... elas vêm rolando no tempo... morninhas, como se as ouvisse agora.
Beijo.
na minha viagem à Italia, me emocionei em duas situações: quando me deparei com o Davi de Michelangelo e no túmulo de Santo Antonio, na catedral de Pádua: aqui, chorei abraçado ao mausoleu negro do santo. Tenho com Antonio um xamego quase inexplicável.
Também tive um Antonio. Ainda o tenho, na figura eterna de meu pai. Belo texto.
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