
Acostumei-me com o que é finito. Por isso é que não consegui ter uma boa vivência com um presente que ganhei de minha irmã, no meu aniversário: um MP-4. Eu me habituei, a vida inteira, a ouvir a música acabar; a levantar e virar o disco; a levantar e mudar o cd; a levantar e desligar a vitrola. Aí, de repente, me deparo com o infinito: o infinito musical. Senti logo que eu iria endoidar se continuasse ouvindo aquilo a viagem inteira. Fiquei encurralada na música que mais amo, diante de uma curva. Ou ela ou eu. Drástica assim mesmo, que tenho os miolos fracos. Sono? Como ter sono ouvindo músicas que nunca nunca acabam? E o tin tin tin tinindo os tímpanos. É preciso dar valor ao presente de uma irmã, não posso, não posso deixar de usufruí-lo; tenho, como ela mesma vive dizendo, que sair do século dezoito, jogar o espartilho e o chapéu fora; e, claro, também o gramofone. Aprisionado dentro de meu ouvido, Roberto Carlos às dúzias, ou melhor, numa dízima. E a diversidade? Como nunca imaginei aos onze anos, deitada naquele sofá de plástico vermelho lá de casa, ao escutar nossa velha radiola. Já duas horas de viagem e a cantoria em pé de guerra. Até que retirei o fone do ouvido, peguei tudo ligeiro e coloquei dentro da bolsa, com uma força que nunca tive. Será que farei algo semelhante ao descobrir-me um dia diante da eternidade?
Imagem: "caminho sem fim". In: www.google.com.br