terça-feira, 4 de março de 2008

O destino dos amantes

Um dia, conversando com alguém, saí com a seguinte afirmação: "É, Deus deve impedir, sim, que o destino dos amantes, depois que morram, seja o umbral". (Para quem não sabe o que é umbral, segundo a doutrina espírita é o lugar parecido com o inferno psíquico: lama, lama, lama, sofrimento, desordem local e mental, para onde vão, em primeira instância, aqueles que morrem por excessos cometidos contra si e os outros. Todos nós certamente iremos para lá.) A pessoa que ouviu isso levou um susto e perguntou se a frase era minha. Claro, é minha sim, saiu agora, nova em folha. Mas esse não é um pensamento original, já vi variações dessa frase em muitas leituras que fiz. Os amantes não devem ir ao purgatório, coisas desse tipo, como: Deus vai sempre perdoar os pecados de amor, etc. Chega a ser meio brega se o pensamento não for bem articulado,e, claro, se o amor também for por aí. Ah, se o amor for pequeno então, umbral na certa: não há perdão de Deus para mesquinharias, para amor sem beleza poética, sem entrega, sem encantamento, sem amor mesmo. Por isso acredito que Vinícius de Moraes não passou pelo umbral: foi direto para o lugar que merecia: um lugar onde a música e a poesia e as mulheres lhe enlaçavam em festas e arroubos de felicidade celestial. Pode ser uma heresia o que estou dizendo, mas é o que sinto agora. O poetinha não cabe dentro de um umbral, lugar fétido, onde estão os seres (lembrando Bandeira)"terra-a-terra e sem nenhuma fumaça de literatura". O poetinha merece ouvir o canto dos anjos, com suas harpas harmoniosas, e um colóquio sentimental, no fim da tarde, com seu amigo Rubem Braga, comentando, ambos, sobre a beleza do Rio e as atuais garotas de Ipanema.
Imagino um Deus complacente nos casos de amor impossível; um Deus que sabe ser a vida não cartesiana; que entende o sofrimento como algo não exclusivo, mas de todos os que aqui estão, com seus destinos entrelaçados feito nuvens que se encontram e se diluem, e sem ao menos saberem por que isso acontece. Deus, com certeza, tem piedade de todos nós, humanos que somos e não anjos: pobres seres que se encontram com o indizível apenas por algumas vias, como a intuição, a poesia e o amor "que não pode ser".

6 comentários:

Anônimo disse...

Perdoe-me, Aérea Persona, mas ri em alguns trechos. Heresia, talvez. Mas seu texto tem uma graça-que-não-se-esconde nem mesmo falando de umbral, lama fétida, essas coisas da escuridão. Não sei o porquê, mas achei engraçado esse post...rs...abr. (carlos)

Anônimo disse...

O amor é o maior dos sentimentos, é o maior ditame de Deus, amor ao próximo, amor a si mesmo,realmente não acredito que quem ame vá para o umbral. Para os amantes, e não os carnais cheios de luxúria, mas aqueles puros que amam o amigo, o pai a mãe o irmão, o céu é o destino certo.

Senhorita B. disse...

Nauta,
Pouco desse mundo pode ser.
Beijos,
Renata

Anônimo disse...

Ai, que bom que vou passar a léguas do umbral! Seus textos são sempre maravilhosos e me emocionam muito!O nome da anônima atarantada aqui é Soraya.

Anônimo disse...

Ai, que bom que vou passar a léguas do umbral, destino dos desmedidos! Seu blog sempre me comove. Adoro os textos. Beijos.Em tempo o nome da atarantada aqui é Soraya.

Anônimo disse...

Ai, que bom que desmedida como sou vou ficar a léguas do umbral! Seus textos sempre me comovem.