terça-feira, 28 de julho de 2009
Quando a porta se abre
No divã aprendo a viver o desejo. Invento em mim mulheres cortesãs, antigas; ou Sherazade, querendo vencer a morte pelas palavras. O sultão apenas me ouve. Todas que vêm ali ele mata, mata como quem dá um remédio amargo. Todas para ele são crianças, mulheres infantilizadas. Quando a porta se abre, percebo que dentro mora a sedução, doença incurável. Que importa a dissimulação do inconsciente? Ele não cede, mais uma vez mata. Vive de matar crianças endemoninhadas. E é pago para isso: para criar e desfazer um indissolúvel feitiço. Não se cansa, não se cansa. A grande trança que ostento nos cabelos não lhe cega, não lhe compra. Minha roupa mais querida da infância ele alcança e ostenta no cabide. Minha roupa mais bonita, mais afoita, mais curta. Nua e desprotegida, invento mulheres antigas, vestidas de vermelho rubro, dançando tango, desesperadas. Nua, ao seu lado, invento malabarismos na linguagem, frases lapidadas, histórias que nunca, nunca se acabam.
Imagem: "Carrossel", por Renata Beltrão.
(www.flickr.com)
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6 comentários:
hummm...
Notei uma transformação na linguagem. Não mais colada à memória - reflexiva, talvez?
Texto muito interessante.
Eu diria, mais solta, imaginação livre; é, ao fim e ao cabo, Janaína já disse bem, menos "colada à memória".
Galopante.
Concordo com os comentários, e me permito acrescentar : muito bom também.
re-inventando histórias , vamos também inventando novas maneiras da rotina não ser refém
Cada vez melhor, acrescento!
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