sábado, 19 de janeiro de 2008

Conversando no divã novamente

Muitas coisas aprendi com a terapia. A primeira delas: declarar amor. Antes eu não tinha coragem, hoje vivo dizendo: "amo você", "amo vocês", sem nenhum pudor, sem ficar vermelha. E com isso aprendi a dizer também cruéis verdades, na cara. Claro que com a mais doce voz que é possível, como um canto, mas digo. Dizer que ama desconcerta o ouvinte, ele fica sem saber o que falar depois, fica sem graça... Dizer o desagradável desconcerta mais ainda, mas nos liberta mais ainda também.
Com a terapia aprendi muitas outras coisas. Todas sobre mim. Coisas terríveis, coisas de cigana dissimulada, com olhos oblíquos e tudo. A dissimulação é algo que me seduz. Ontem mesmo disse uma "mentira" na frente de um grupo de pessoas e me senti o máximo. Alguém me perguntou se eu tinha blog e eu disse "não, não tenho blog". Não pensei que tal declaração poderia me dar tanto prazer. Ah, a dissimulação, não a mentira... A dissimulação como fetiche, como forma de existir e de se proteger, de se libertar.
Uma certa feita o psicólogo me deu alta. Me senti como que saindo do hospital depois de uma longa temporada, e com um diagnóstico: "estou sã". Que nada, que sã que nada. Voltei logo depois, às pressas, porque não conseguia escrever o último capítulo de minha tese. A mulher "sã" estava novamente doente. E acabei voltando várias vezes, e cada vez mais gravemente doente...
O psicólogo funciona como se fosse um duplo meu: olhar para ele é como olhar para um espelho. E muitas vezes esse espelho irrita demais. Se antigamente eu não tinha coragem de me dizer certas verdades, aprendi a dizê-las para o psicólogo. Claro que é desconfortante ver alguém ali na sua frente olhando para você como se você fosse um rato de laboratório. Porém percebi que o cientista, que é o psicólogo, pode amar o rato de laboratório, e não ter nojo dele. Não adianta, pelo menos no meu caso, não desisti da história do amor. Abaixo Freud, e etc e tal. Quero me sentir amada, porque só assim conseguirei me amar. É a coisa do reflexo mesmo.
Desde o primeiro dia de terapia faço manifesto. Esse manifesto é semanal: "quero amor", "me dê amor", "eu só fico aqui se não sentir frieza em você", etc. Não, não estou falando do amor sexual, mas da ternura. Quero olhar para o psicólogo e ver, nos seus olhos, ternura pela minha tragédia de existir.

4 comentários:

Kátia Borges disse...

Oi, Aeronauta, vontade de sair distribuindo comentários em seus posts, todos deliciosos. Mas vou me concentrar aqui, um ponto que é delicado para mim, a relação com a terapia e os terapeutas. Sempre a sensação de desconstruir e ficar a nu, de perder as defesas. Besos.

Kátia Borges disse...

Oi, é sim. Só não tô vendendo a alma. Besos again.

Unknown disse...

Nao dissimule sobre seu blog, ele deve ser divulgado, ter propaganda em outdoors e televisão!

sandro so disse...

Então a análise te tornou desavergonhada, heim? E dissimulada?!?! Que bom saber disso, caso cruze com uma aeronauta por aí...