segunda-feira, 11 de maio de 2009
A bela adormecida
*Este é um dos poemas mais lindos que li nos últimos tempos...
A bela adormecida
Seja como for, ela dorme. É possível que durma por mil anos.
Eu sou o cão que guarda o seu sono por mil anos.
Sua inocência explica tão longo encantamento.
O mistério pousará em sua testa, tentará corrompê-la
com as promessas da vida comum:
um príncipe, um cavalo, um castelo.
Entretanto, é improvável que beijos possam
com tamanha vontade de esquecer – a si mesma,
e à beleza que era o seu atributo mais decantado,
e que talvez não fenecesse nem com o tempo
ou a morte – pois resistiu a mil anos de heras e ruínas.
Isso tudo eu sei por ter estado sempre aqui,
embora ninguém suspeitasse da existência do monstro insone,
testemunha da beleza desperdiçada.
Providencio para que a floresta se adense, ano após ano,
e se adensem também as sombras no coração do príncipe,
para que ele enxergue não as possibilidades
deste corpo intacto, mas o horror do feitiço,
o cheiro de mofo e a estupidez da renúncia.
O demônio me impede de libertá-la; o anjo, de desposá-la;
a humanidade, o encanto sobre mim,
me impede de matá-la.
Não sou a fera que ama a bela.
Sou antes a besta desordenada que guarda o ermo e suas criaturas.
Estou no âmago das histórias realmente estranhas.
Ignoro o mal, e o bem para mim é tão infantil.
Habito as lendas para povoá-las com as distorções necessárias.
Me interesso especialmente por essa criança que dorme.
Se o príncipe a toma de mim – e dela mesma – ficarei tão enfurecido
que envenenarei o mundo e o mundo adormecerá.
Ela partirá, acordada.
O mundo todo adormecerá.
Autor: Nilson Pedro.
Extraído do blogue "Blag": http://nilsonpedro.wordpress.com
Imagem: "Encantamento", por César Augusto.
(www.flickr.com)
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9 comentários:
Lindo! Esse Nilson é fera, sim.
Muito lindo mesmo. Saudades de você. Beijos, M.
quiuspariu! é lindo mesmo!
Já é um privilégio estar aqui, e, mais ainda, ler o que você diz a respeito do poema. Fico feliz e, como diz Maria, grato, gratíssimo!
Vou usar aquela coisa toda que adoro dizer para quem merece: tiro o chapéu, estendo o tapete vermelho e peço que pise. Tudo para a poesia de Nilson. Este poema, escolhido por aeronauta, é emblemático do poder desta poesia que estamos acompanhando no blog Blag. O privilégio é nosso,seus leitores.
Lindo!
Belo, belíssimo.
E como escreve bem esse moço...
Nosso poeta (digo nosso porque já nos pertence, aos é-amigos) é da pesada. Acho superbacana como você, Martha, Kátia publicam poemas dos colegas. Beijo grato por esta publicação
Maria
Porreta! Very porreta!
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