sábado, 1 de agosto de 2009
a jovem poeta
Já senti nos ossos e na vaidade essa coisa de ser chamada "jovem poeta". Melhor, vivi um tempo em que recebíamos no correio cartas com a seguinte destinação: Para a jovem... Romântico, absolutamente romântico esse tempo, que acabou. Mas não acabou a excelência do jovem poeta, o jovem que escreve. Como sei bem o que é isso, e vivi minha glória interiorana com glamour, hoje posso dizer o quanto é interessante. E bom. Só que eu, naquela época, nem tinha a noção do que é ser jovem. O que gostava era da aura, do fato de me olharem e me tratarem diferente por ter publicado um livro. Diziam: "Oh, tão jovem!" Puxa, nem aproveitei o "tão jovem". Mas aproveitei a felicidade de notar todos bestas pelo fato de eu ser escritora. O que eu pensava ingenuamente mesmo era que, com o livro, teria o mundo aos meus pés. O "mundo" seria, claro, os amados mais impossíveis que porventura iria conquistar com minhas palavras escritas e impressas. Ah, que doce equívoco! Doce, dulcíssimo. Aliás, tenho uma ternura muito grande por esse equívoco - que é uma das marcas mais inocentes de meu caráter.
Não conquistando o amor, o que fazer? Sair lançando livro pelas redondezas. E foi o que fiz, com a maior cara de pau. Meu Deus, que vexame era aquele? Mas acontece que eu tinha - na minha larga pretensão - mil exemplares dentro de casa. O que precisava fazer era isso mesmo: sair com as caixas debaixo do braço, lançando livro a torto e a direito em todas as cidadezinhas das lavras. O povo me acolhia. Um fenômeno: "tão jovem!" E os livros sendo vendidos, devidamente autografados, eu me sentindo una grande celebridad.
Como disse, vendi alguns livros, mas nunca cheguei aos mil, obviamente. Até hoje eles perseguem minhas moradas, meio amarelecidos, mas renintentes, na sua teimosia de continuar existindo. E, como se não bastasse, quatro anos depois lancei outro livro. Mais mil. Haja pretensão. E ainda era jovem, muito jovem. Continuei sem entender direito esse epíteto; porém, aproveitei, e bem, a aura de ser escritora.
Logo após fui fazer faculdade, vinda do interior. E os professores me tratavam diferente. Eu, uma tímida pavorosa, aproveitava as chances que meus livrinhos bobos me davam. E foi assim até chegar aos trinta. Os trinta anos nos tiram a aura. E nos dão um profundo ceticismo e autoanálise. Foi nos trinta que interceptei essa coisa de mais um livro com edição de mil exemplares. Fiquei nas fronteiras das antologias. Muito mais tímida. Desconfiada. Querendo dar um fim absoluto aos dois primeiros "filhotes". Negar, para sempre, a existência da jovem poeta.
Desde então me escondo, me escondo. Não nego o sonho de novamente publicar um livro. Com a modéstia perversa de cinquenta exemplares. Sei que agora não há mais aura; publicar é a coisa mais corriqueira que existe. Mas a "jovem poeta" persiste apenas num detalhe: ela continua abraçando cegamente o doce, dulcíssimo equívoco de com palavras escritas e impressas conquistar amores impossíveis.
Imagem: "Sem título", Rayani Melo.
(www.flickr.com)
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17 comentários:
Muito bacana e muito honesto também.
conquistou o meu
Aero, publique mais livros, sim! E se ainda tiver algum livro meio amarelecido, me fala que eu compro! Um beijo!
Oi, Lidi,
E eu sou lá mulher de vender livro? Nem quando eu era uma "jovem poeta": quem vendia eram os meus amigos. Eu lhe daria, de bom grado, o amarelecido, só que o livro é muito imaturo. Não tenho coragem. Bjos.
Continue, antes de qualquer coisa, escrevendo. Publicar pode ser consequência, ou não. Mais importante é sentir através das palavras.
Beijo grande
Hora de parar de se esconder, aero: os dois primeiros são livros da juventude - já sem aura, vê? -, os próximos serão da escritora madura que você é agora, como tem provado e comprovado aqui no blog.
assinando embaixo de Lord e de Jana.
Maria
Plagiando Maria Sampaio, assino embaixo de Janaína e Lord.
o que eu digo,meudeusdocéu, o que eu digo? se vc pensa assim,me arrependo de ter lhe mostrado minhas baboseiras imaturas...
Mas eu queria conhecer esses livros. Fez melhor que eu, por exemplo, que queimei as coisas feitas até os 20 e fiquei mudo por um bom tempo. Hoje vejo: queria mostrar, mas os poemas se foram para sempre. E concordo com Gusmão: esses textos da Aeronauta SÃO um livro, um puta livro em plena maturidade!
Poxa, lindo. Gostaria de ler um livro seu, com mil, 500, 100 ou 50 exemplares. Beijão
Vc nao devia deixar de publicar nunca!
Vem cá...to com medo dos 30!
Pq nao compila os textos do blog e publica?! Ia ser mto bom!
Seu livro já está sendo publicado a cada postagem que vc faz neste blog. É sempre um prazer vir aqui. :-)
Acho que esse foi um dos textos mais lindos que li nos últimos dias, Nauta! Tb quero comprar um exemplar de cada livro da "jovem poeta". Separa os meus, tá?
Beijo!
Se precisar de um hotblog...
Mulé, vambora....
tem que ser, né?
Bj
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