domingo, 22 de março de 2009

A menina de Minas


Meu ódio e meu amor têm a mesma proporção: às vezes amo Guimarães Rosa às vezes o odeio. A mesma coisa se dá com Clarice Lispector. São os dois escritores que mais modificam os meus sentimentos de gosto. Tem contos de Guimarães, como "Seqüência" - aquela da vaquinha que sai correndo e faz com que o rapaz encontre seu grande amor -, que são de pura magia; em contrapartida, contos que já gostei hoje detesto. Como "A menina de lá". Atualmente não consigo ler esse conto pra não ter raiva de Rosa. "Ele xurugou?" - essa falinha ridícula de Nhinhinha me irrita. É, podem me mandar pra fogueira, porque hoje estou com a macaca. Então, me deixem falar mal de Rosa. Ou melhor, da menininha santinha coisa nenhuma. Fiz uma nova leitura desse conto e vi que ele não é nada fantástico. Nhinhinha nunca fez milagres, e o próprio narrador é quem sugere isso em muitos momentos. Vejam: "O que falava, às vezes era comum, a gente é que ouvia exagerado". Sem contar que a mãe da dita cuja "nunca tirava o terço da mão, mesmo quando matando galinhas".(Grifos meus.) Essa nova leitura até o engrandece, modéstia à parte. E talvez seja este mesmo o grande segredo do conto, e que poderá salvá-lo um dia (como estou metida hoje).
Me lembrei agora da apresentação de tal narrativa por um grupo de alunos. Claro, normal, todo mundo foi buscar o fantástico. Ouvi com generosidade, e com muito enfado também. Antes da apresentação, perguntei bestialmente, de propósito, à classe: "Esse título, A menina de lá, sugere que essa menina é de onde"? Um aluno, que não havia lido o conto, respondeu prontamente: "de Minas Gerais". Todo mundo riu. Só que na errância o desgramado do aluno acabou acertando. Seria muito besta Guimarães escrever um conto e colocar um título tão óbvio ("Lá"? Do outro mundo? Oh!"). Principalmente ele, que escreveu "A terceira margem do rio", etc.
É, gente, essa menina é de Minas Gerais mesmo, não é de outro mundo não. Posso provar. Ou melhor, comprovar. Outro dia, que agora estou com preguiça.


Imagem: "A menina de lá", por DiCésar.
(www.flickr.com)

3 comentários:

Bernardo Guimarães disse...

macaca é pouco!
chama a irmã pra dar uns pau nele também!

Anônimo disse...

Eu adoro conversa assim arrevesada, do gosta não gosta. Mais ainda com o amado desamado sendo do porte do referido idolatrado salve salve.

Eliana Mara Chiossi disse...

Linda, fiquei pensando em Miguilim.
Pra mim, é tudo mágico e tão doloroso, lá dentro daquele universo.
E se isso fosse o único texto de Rosa, eu seria sempre fisgada!
Vamos falar de Ponge? Me manda notícias, ainda busco. Tenho pouco material, comprei uns livros pelo Submarino...
Amei seu texto sobre os Vestígios da Renata. Uma leitura incrível...

Bom restinho de domingo...

Beijos