sábado, 13 de junho de 2009
machadiana
Sou uma mulher machadiana, silenciosa e entrada em anos. Minhas mãos não têm mais a suavidade dos vinte, e a conversação que proponho é tímida, reticente, sem qualquer esperança. Ganhei com o tempo um rosto severo, com marcas delimitadas pelo espelho mais cruel. Nele nem o meu sorriso é como era: quando se abre, uma nuvem se aproxima em confidência íntima, eterna. Meu corpo sem filhos ganhou o contorno dos rios já vividos, sinuosos e vastos, e nas frestas de minha pele habitam peixes como se no aquário estivessem. Veias partidas aparecem nas minhas pernas, condenando-me à mais primitiva das belezas, à ternura das mais antigas pedras. Meus cabelos, como plantas aquáticas, crescem, crescem, e fios brancos despontam, pálidos, errantes. Tudo em mim é natureza se transformando, árvore plena carregada de troncos.
Imagem: Sépia, por Maggie2012.
(www.flickr.com)
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28 comentários:
Ouvindo tua escrita lírica, ressoam os versos cantados por Bethânia: "...Já sei olhar o rio por onde a vida passa".
Como não publicar estes textos???
Muito lindo, forte, bravo mesmo em se revelar tanto assim - não a você mesma, claro. Sem essencialismos, por favor!!! A escrita é isso, é este trnsbordamento de si!
Obrigada, meus dois queridos, por estarem aqui juntinhos de mim.
Beleza. Comovente.
Linda essa sua descrição das mudanças, da maturidade e, sobretudo, a aceitação tranquila das transformações. Plenitude. Beijos.
belo, belo!
Muito bom. Bom demais.Maturidade, serenidade. Força lírica!
Mais um doce fruto dessa belíssima árvore pela qual minha alma passarinha se apaixonou.
Como você escreve bem! Parabéns! Nunca visitei seu blog porque o "aeronauta" não me pareceu atraente, pensei em uma menininha superficial. Mais uma vez o engano da aparência! Pretendo voltar a ler seus textos, para meu prazer. Sua escrita é madura e fluente.
Maravilhoso como sempre.
Bjs
Gostei tanto deste texto que me permito dois palpites: "nadassem", em vez de "estivessem", e "condenando-me" (mais machadiano), em vez da próclise.
Lindo!
Cada vez que venho aqui me encanto com as coisas que você escreve. Sem palavras.
Excelente!E fico feliz ao constatar que Gláucia Lemos também foi seduzida. Enfatizarei exatamente este efeito, este poder que os blogs têm.
leve você e sua versão machadiana. aparece para me dar um abraço, nesta hora que parece ser de euforia, mas é uma hora de tantas dúvidas... aparece por lá... mesmo que eu não saiba...
Eis a grandiosidade de sua beleza, no amplo sentido que ela tem: da beleza poética, da beleza de ser quem se é.
Beijos!
quando crescer,quero escrever assim...
Falar da maturidade com essa beleza é incrível. Já disse antes, gostaria de escrever como voce, mas hoje fico com Bernardo: quando crescer quero escrever assim. Lindamente.
Ufa!!!!
Falar do tempo e seus efeito sobre o homem não é uma tarefa das mais fáceis, mas para você...não há dificuldade com as palavras!!!
Parabéns mais uma vez!!!
absurdo de lindo!
Corpo e alma. Perfeito.
Denso, realmente criativo e bastante inspirador.
Que beleza de imagens!!!!
"Veias partidas aparecem nas minhas pernas, condenando-me à mais primitiva das belezas, à ternura das mais antigas pedras".
Pedradura! Belíssimo.
Irretocável, Aérea Persona. O livro que vc costura aqui tem tutano e asas poderosas. É, na verdade, uma constante lição de como bem usar biografia na construção literária. Leitura necessária, blogue de lincagem e citação obrigatórias. Abr. (carlos)
Você escreve bem demais!
Obrigada a todos vocês, amigos, pelos comentários. Abraços.
Herica
Lindo demais!
Aeronauta,que loucura!
Essa entrou pelos poros, como acupuntura.
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