terça-feira, 16 de setembro de 2008

Inconfidências

Tenho zilhões de provas para corrigir, mas é como se não tivesse. Nunca soube estar na realidade. Desde menina. E foi o que continuei ouvindo das pessoas, vida a fora. O último vivente que reiterou isso com precisão foi meu psicanalista. Mas que, igual a todos, ao tentar me trazer à realidade, fracassou.
O chamado real para mim é algo espesso demais. E ao invés de corrigir provas eu prefiro ficar aqui, dedilhando, tentando entrar em alguma nuvem. Podem me chamar de doida, que esse epíteto também me persegue. Vim de uma cidade de doidos, e pai falava que um dia iria embora dali, pois não queria acabar seus dias penando pelo mundo. Dizia que a serra esquenta o juízo. Meu juízo há muito vive quente. E se tudo é questão de nomenclatura, aceito essa de doida. Que doido pode fazer tudo, que doido tem a máxima liberdade, que doido tem a vida toda pra ele.
Pois é, sou doidona! Minha casa há muito não vê vassoura.(Ou seria porcona?) Há exatamente três semanas lavei umas mudas de roupa e nunca tirei do varal. Vou tirando à medida que preciso pra ir vestindo. Então as blusas ficam todas com uma marca no meio (do varal) que não tem ferro que tire. Trago na agenda vários telefones de diaristas, mas ostento o defeito de não gostar de ver gente se enfiando na minha casa, para lá e para cá. Só eu posso fazer faxina - quando Deus for servido. Livros? Ah, meus livros estão numa completa desordem nas estantes. São Longuinho trabalha todo santo dia pra encontrar pra mim o livro que procuro, no maior desespero do mundo! Todo dia é assim: São Longuinho por favor me mostre onde está o livro tal... E vai ele, coitado, trabalhar e encontrar o livro. E vou eu dar pulinhos e gritinhos e assoviozinhos. Isso é coisa de doido? É. Ou de preguiçosa: das duas uma. Ou nenhuma: pois não tem epíteto que nos defina: seres extraviados pelo mundo, com a idéia positivista, no consciente, da ordem e do progresso - que nunca virão.

8 comentários:

Lua O. disse...

Olá...!
Desculpe a invasão assim, sem mais nem menos. Mas é que vi seu blog na página de uma blogueira em comum e resolvi dar uma fuçadinha.
E adorei o post!
Não nos mesmos moldes, mas até um pouco parecido com o último que escrevi.
Tipo "deixa a vida me levar."

Enfim... adorei a visita.

Beijo

P.S- Putz... Vc escreve bem, hein?

Janaina Amado disse...

Também sou cliente assídua de São Longuinho, he he E também gosto de entrar em nuvens, neblinas e caramanchões.

Anônimo disse...

Aeronauta, minha amiga, me identifiquei TOTALMENTE!

Haja são longuinho para encontrar nossos livros e a nós mesmos, perdidos, loucos desvairados, no meio das estantes da vida!

Menina da Ilha disse...

Queria até lhe fazer uma visita, mas acho que vou deixar para a próxima semana. Ânimo! Ânimo!Dê um descanso para o pobre Longuinho.

Bernardo Guimarães disse...

Não quero nem pensar se vc, em vez de nos escrever os textos que sorvemos, parasse pra arrumar casa! Pelamordedeus, deixa como está, ninguem vai reparar no vinco da camisa.

- Luli Facciolla - disse...

Tadinho do São Longuinho...

Amei o texto Aero!
E, mais uma vez, como disse Bernardo: "Pelamordedeus, deixa como está, ninguem vai reparar no vinco da camisa"!!!

Beijos

Vivz disse...

Hahahahahah, adorei, Nauta! A preguiça tb me consome. Quase sempre opto por fazer nada, fitar o teto e pensar besteiras a fazer o que tenho que fazer. Ah, e tb odeio gente pra lá e pra cá dentro de casa. Me identifiquei horrores! Bjs.

Nilson disse...

Vi uma vez na Exame que uma mesa de trabalho bagunçada é coisa de gente criativa. E vi tb que a bagunça é produtiva justamente porque permite fazer conexões impensadas, difíceis de ocorrer com tudo arrumadinho. Dito isso, devo confessar que aqui em casa tb é uma bagunça. Essas teorias têm que estar certas!!!