sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Discurso amoroso


Quando comecei a escrever versos, aos doze anos, endoidei completamente: era o tempo inteiro escrevendo, dia e noite; claro, bobagem, muita bobagem. Fazia poesia para o mundo, para os colegas, para a professora, para a cidade, para a rua, para isso e aquilo outro. Abri uma torneira de poesia ruim que não acabava nunca. O pior de tudo é que as pessoas gostavam. Eu tinha uma platéia de queixo caído com tanto "talento", elogiando essa besteirada toda. Preenchi um caderno de mais de trezentas páginas que, graças a mãe e a Deus, o rio levou.
Nessa época amava um menino moreno, quase cabo verde, até bonitinho. Achava que minha poesia o conquistaria. Engraçado, repeti isso a minha vida inteira. Até hoje, ao ficar apaixonada, escrevo versos para o objeto amoroso. Devo escrever muito mal porque nunca consegui conquistar nenhum deles com minha poesia. Alguns chegaram a ficar comovidos e, pior, convencidos; mas um poema meu nunca me rendeu um beijo como recompensa.
Essa explanação explica porque endoidei a escrever versos quando conheci o último amor. Era verso saindo por todos os poros. Quebrantei-me. Escrevi um livro grande - que até hoje está no limbo da gaveta, vivendo de traças. A cada poema que fazia ao meu eleito, mais o dito inchava. Fui engordando o sujeito com dísticos e metáforas, deixando-o completamente impassível diante de tanta lisonja.
É, amor e poesia não combinam mesmo. Por isso hoje escrevo pouco, amo menos ainda.


Imagem: "frida kahlo, fragmentos de um discurso amoroso", por walterbenjamin. In: www.flickr.com

6 comentários:

Muadiê Maria disse...

Ora, ora, se a poeta é das boas,com certeza, só posso concluir que escolheu maus leitores...

Unknown disse...

o comentário de Muadiê é tão bom, esqueci o meu e assino o dela!

Anônimo disse...

Escrever pouco às vezes é sinal de qualidade. Obrigado pela visita à Caverna.

Abraço.

Anônimo disse...

Não me conveceu que escreve mau. As publicações aqui feitas revelam uma pessoa de sensibilidade e que escreve com a alma. Não posso julgar suas poesias. Não as conheço. Teria imenso prazer em lê-las, quem sabe um dia?
Estou adorando O Amunuense Belmiro, posso dizer que passei minhas ferias bem acompanhado. bjus

Unknown disse...

Epa quem disse q nao conquistou ngm com sua poesia, me conquistou, e t ofereco um beijo! Q tal>? hehehe

Anônimo disse...

Pudesse voltar no tempo e soubesse nadar resgatava o caderno de besteiradas do fundo do rio. Quem sabe uma visita à gaveta?
Não posso uma coisa nem outra, mas te ler aqui já é uma experiência sensorial das boas, inda que nunca entenda como tanto amor assim pode causar tanta dor.