Fomos para a casa de minha avó. Lembro de mãe e de
minha tia mais nova usando aqueles vestidos curtinhos da década de 60 e 70. As
duas se davam bem, conversavam muito, mas eu sempre grudada na barra da saia de
mãe. Eu tinha quatro anos de idade, sufocava mãe, assim como ela me sufocava,
só que eu não tinha noção disso, ela era meu elo com o mundo; mundo do qual eu
tinha tanto medo. Mas nesse dia a família toda foi para a casa de dona Calu,
minha avó. Minha avó sempre foi braba, não tinha paciência para neto não. O
carinho dela era dar a cada um uma coalhada bem feita numa caneca de alumínio.
Pois bem. Mãe conversava com tia Lia já tramando o que ambas iriam fazer: iriam
passear na feira de um povoado próximo, só eu não poderia ter ciência disso.
Claro, não queriam me levar. Fizeram tudo calculado, mas muito calculado, já
que eu não saía da barra da saia de mãe e não percebi o que estava acontecendo.
De repente me vi no meio do terreiro, desamparada, procurando por mãe (a
estrada de carro à frente) e eu gritando em desespero de morte: "mãe, mãe,
mãe!", parecendo que iria ter um ataque. Corri para a estrada e se não
fosse minha avó, com uma sandália na mão querendo me bater, eu morreria
atropelada. Ela me deu um grito, me botou pra dentro de casa, valente que só
ela, e ameaçou me bater. Chorei o dia inteiro, até mãe chegar, já de
tardezinha, meiga, como se nada tivesse acontecido.
Duas grandes mágoas: só minha mãe poderia me bater, queria dizer isso pra minha
avó, mas não tive coragem. A outra mágoa foi o cálculo de mãe, a estratégia, a
traição: foi a primeira vez que fui traída na vida.
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